terça-feira, 22 de julho de 2014

Rubem Alves e a Pedra Branca


“Num pequeno lugar do sul de Minas, Pocinhos do Rio Verde, há um pico de pedra bruta, a “Pedra Branca”. Para se chegar ao alto passa-se por um bosque com regatos e poços de água cristalina. Saindo do bosque, é a pedra bruta, trabalhada pelo vento e pela água, através dos milênios...” 
Rubem Alves


Rubem Alves amava a Pedra Branca. Eu também.

A montanha sagrada de Caldas, no Sul de Minas Gerais, está em meu imaginário desde o começo da adolescência, por causa das histórias de acampamentos e “expedições” que meus coleguinhas-escoteiros mais velhos contavam. Um dia chegou a minha vez de acampar na mítica montanha - foi uma das experiências mais marcantes que tive e que me despertou um grande amor e mesmo um fascínio pelas montanhas. Subi no seu topo apenas em mais uma ocasião, mas mais tarde a contemplei, desenhei e pintei inúmeras vezes.  Muito tempo depois fui morar uma temporada em Caldas e lá conheci Rubem Alves. Nada sabia sobre o escritor, até que li uma edição do jornalzinho que ele mesmo publicava na cidade. Identifiquei-me muito com os seu textos, com a forma simples e profunda de falar das coisas belas e importantes da vida e as suas ideias sobre ecologia e humanidade para a nossa pequena cidade. Queria muito conhecê-lo, até que fui apresentado a um casal especial, Tomiko e Hans, também novos moradores de Caldas e grandes amigos do Rubem. Em pouco tempo já participava dos gostosos almoços, jantares, e cafés que a Tomiko preparava na sua linda e antiga casa mineira. Em alguns deles, estava o Rubem Alves, quando vinha de Campinas para refrescar a cabeça e curtir seu chalezinho nas montanhas de Pocinhos do Rio Verde, distrito de Caldas, pertinho da Pedra Branca, que ele tanto amava e se preocupava. Ficamos amigos e para mim era sempre uma celebração quando nos encontrávamos: adorava sua conversa e ouvia com atenção as suas histórias, suas ideias sobre a vida. Uma das minhas melhores passagens de ano foi justamente no seu chalé, no caminho da Pedra: foi uma noite linda e aconchegante, com pouca gente, inclusive os meus pais, que tiveram a alegria de conhecê-lo. Muita história, muita conversa boa e alguma cantoria. Para coroar a madrugada, um improvável e majestoso urubu-rei apareceu pousado na varanda do chalé. Ficamos em silêncio espiando. Noite inesquecível.


As serras da região de Caldas e principalmente a Pedra Branca eram os temas mais frequentes do meu trabalho naquela época. Eu tinha muitos esboços, aquarelas e algumas telas com a pintura da montanha. Uma delas, a maior, ficava na varanda de minha casa e decidi que nunca a venderia. Porém, na primeira vez que o Rubem lá esteve, se apaixonou pela tela. Quis comprá-la de qualquer jeito. Não tive dúvida - a tela tinha que ser dele! Comprou a pintura da Montanha e levou para sua casa em Campinas. Fiquei muito feliz que a “minha” Pedra Branca, que ambos amávamos, tenha ficado com ele e que ela estaria ali, disponível em sua sala para ser contemplada e lembrada, mesmo estando longe de Caldas.

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